segunda-feira, 5 de março de 2007

Oh Josué!!


Há quem diga que a relação de Josué com a Cena Mangue é meramente incidental, não sendo uma influência de fato. O jornalista Jose Telles, em uma entrevista para essa pesquisa, revelou ter sido quem indicou a leitura de Josué de Castro para Chico Science, que teria lido apenas o romance escrito por Josué: "Homens e Caranguejos". Um aluno da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro me contou uma história de que Chico Science freqüentava a biblioteca para ler os livros de Josué e, voltando para casa, encontrou um mendigo pedindo comida no ponto de ônibus. Chico então tirou seu sanduíche da mochila, deu ao mendigo e bolou o famoso refrão: “Oh Josué, eu nunca vi tamanha desgraça. Quanto mais msiéria tem, mais urubu ameaça”. Não sei como ele ficou sabendo dessa história. Ou talvez não tenha sabido mesmo. Só tenha inventado. É assim que nascem os mitos!

Verdade ou não, quem leu ou não leu Josué, não é mais significativo do que a escolha dele como referência para os mangueboys. Josué não apenas está presente como um interlocutor imaginário em algumas músicas de Chico Science, como sua influência pode ser lida nas entrelinhas de muitas outras músicas, não só da Nação Zumbi como de outras bandas. Assim como aparece nomeadamente no texto de “Caranguejos com Cérebro”, release escrito por Fred 04, em 1992, que se transformou no manifesto do Manguebeat:
"Os mangueboys e manguegirls são indivíduos interessados em hip-hop, colapso da modernidade, Caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência. "

O certo é que a Cena Mangue extrapola essa conexão com o pensamento de Josué de Castro. E apesar de minha porta de entrada na pesquisa ter sido o autor de “Geografia da Fome”, essa se tornou uma porta dentre tantas que começaram a aparecer desde que iniciei meu doutorado. Nesse tempo, o Manguebeat tem se revelado para mim um tema diverso com uma incrível riqueza e generosidade de aspectos, da mesma forma que o mangue se revelou como um ambiente riquíssimo e diverso para os mangueboys. Assim, me dedico a fazer uma etnografia do Manguebeat, pensando na formação da Cena Mangue, na transformação da Cena em Movimento Manguebeat e nos reflexos disso atualmente. Oh, Josué que me ajude a fazer essa tese!


A quem interessar possa, existe uma dissertação que aborda a conexão entre a obra de Josué de Castro e as músicas de Chico Science, especialmente no que diz respeito aos mocambos de Recife. Se chama “Geografia e Literatura: decifrando a paisagem dos mocambos do Recife”, de Maria Amélia Vilanova Neta, defendida em 2005, na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Nenhum comentário: